Apresentação

“Os dados digitais são o novo petróleo”. Esta frase, cunhada, em 2006, pelo matemático Clive Humby, é ilustrativa da transformação digital das últimas três décadas, pela qual as grandes empresas tecnológicas (Google, Amazon, Facebook, e Apple) extraem massivamente os dados dos seus utilizadores e analisam-nos com intuitos comerciais. Ao equiparar os dados digitais ao petróleo, como se fossem um recurso “natural”, ocorre um processo de neutralização que invisibiliza o contexto relacional, social e político em que esses dados são criados. Neste seminário serão discutidas as principais características que esta transformação digital trouxe ao sistema capitalista e a modalidades de vigilância dos comportamentos das populações, com consequências na democracia, na distribuição de recursos e bem-estar.

Partindo do caso específico do campo da inteligência artificial (IA), os lugares da ciência e tecnologia serão abordados numa dupla perspetiva. Por um lado, serão apresentadas as narrativas laudatórias que enfatizam os benefícios presentes e futuros da IA, ao mesmo tempo que, numa estratégia de legitimação, proclamam a necessidade de “mais ética” e de “uma pausa” no desenvolvimento de IA. Por outro lado, serão abordados o papel da ciência crítica e a necessidade de uma agenda de investigação sobre IA para as ciências sociais. No lugar de uma ética instrumental, frequentemente usada por grandes empresas tecnológicas e governos, propõe-se uma ética pragmática que permita perspetivar cenários que acolham as visões, necessidades e expetativas de diferentes grupos sociais, especialmente dos grupos mais vulneráveis aos impactos negativos de avanços científicos e tecnológicos.


Nota biográfica

Helena Machado é doutorada em Sociologia pela Universidade do Minho, onde atualmente ocupa o cargo de professora catedrática no departamento de Sociologia do Instituto de Ciências Sociais. Da atividade de investigação que desenvolve destaca-se o financiamento atribuído para liderar o projeto EXCHANGE “Geneticistas forenses e a partilha transnacional de informação genética na União Europeia: relações entre ciência e controlo social, cidadania e democracia”, financiado pelo Conselho Europeu (2015-2021). Os seus interesses de investigação intersectam uma variedade de campos, incluindo os estudos sociais da ciência e tecnologia, estudos sociais da vigilância, estudos críticos sobre o uso de algoritmos e ética pragmática. Entre as principais linhas de investigação, destaca-se o seu trabalho problematizando os processos políticos de reformulação de problemas coletivos enquanto problemas de segurança e, em particular, os processos de governação por via de tecnologias de vigilância, temas sobre os quais a conferência aberta, intitulado: “Os lugares da ciência no capitalismo de dados e na sociedade da vigilância”, a realizar no dia 5 de maio, irá incidir.


Atividade no âmbito do doutoramento em "Governação, Conhecimento e Inovação"